sexta-feira, 25 de março de 2011

Vídeos sobre os microorganismos...






Vírus

Vírus


Como ler uma caixa taxonómicaVírus
Estrutura tridimensional do vírus da poliomielite (família: Picornaviridae)
Estrutura tridimensional do vírus da poliomielite (família: Picornaviridae)
Classificação científica

Grupos
I: Vírus dsDNA
II: Vírus ssDNA
III: Vírus dsRNA
IV: Vírus (+)ssRNA
V: Vírus (-)ssRNA
VI: Vírus ssRNA-RT
VII: Vírus dsDNA-RT
  Vírus (do latim virus, "veneno" ou "toxina") são pequenos agentes infecciosos (20-300 ηm de diâmetro) que apresentam genoma constituído de uma ou várias moléculas de ácido nucléico (DNA ou RNA), as quais possuem a forma de fita simples ou dupla. Os ácidos nucléicos dos vírus geralmente apresentam-se revestidos por um envoltório protéico formado por uma ou várias proteínas, o qual pode ainda ser revestido por um complexo envelope formado por uma bicamada lipídica.[1][2]
As partículas virais são estruturas extremamente pequenas, submicroscópicas. A maioria dos vírus apresentam tamanhos diminutos, que estão além dos limites de resolução dos microscópios ópticos, sendo mais comum para a visualização o uso de microscópios eletrônicos.[3][4] Vírus são estruturas simples, se comparados a células, e não são considerados organismos, pois não possuem organelas ou ribossomos, e não apresentam todo o potencial bioquímico (enzimas) necessário à produção de sua própria energia metabólica.[5][3] Eles são considerados parasitas intracelulares obrigatórios, pois dependem de células para se reproduzirem. Além disso, diferentemente dos organismos vivos, os vírus são incapazes de crescer em tamanho e de se dividir. A partir das células hospedeiras, os vírus obtêm: aminoácidos e nucletídeos; maquinaria de síntese de proteínas (ribossomos) e energia metabólica (ATP).[5][3][4]
Fora do ambiente intracelular, os vírus são inertes.[1][2] Porém, uma vez dentro da célula, a capacidade de replicação dos vírus é surpreendente: um único vírus é capaz de produzir, em poucas horas, milhares de novos vírus.[4]
Os vírus são capazes de infectar seres vivos de todos os domínios (Eukaria, Archaea e Bacteria). Desta maneira, os vírus representam a maior diversidade biológica do planeta, sendo mais diversos que bactérias, plantas, fungos e animais juntos.[3][4]

Taxonomia viral

Classificação taxonômica dos vírus

Os vírus também são classificados dentro de grupos taxonômicos, assim como os seres vivos, porém, seguindo uma regra particular de classificação. Vírus não são agrupados em domínio, reino, filos ou classes. Desta maneira, a estrutura geral da taxonomia dos vírus é a seguinte:[4]
Ordem (-virales)
Família (-viridae)
Subfamília (-virinae)
Gênero (-virus)
Espécie
A nomenclatura para ordens, famílias, subfamílias e gêneros é sempre precedida pelos sufixos apresentados acima. Já a nomenclatura de espécies não possui um padrão universal. Cada ramo da virologia (vegetal, animal, bacteriana, médica) adota um padrão de nomenclatura específico. Espécies de vírus de plantas normalmente apresentam nomes que fazem referência a planta hospedeira e a característica do sintoma causado pela infecção (e.g. Vírus do mosaico do tabaco). Espécies de vírus de bactérias (bacteriófagos) podem ser denominados como "fago" seguido de uma letra grega (e.g. Fago λ) ou código alfanumérico (e.g. Fago T7). Vírus que infectam vertebrados podem receber nomes em alusão à espécie hospedeira de origem (e.g. Papillomavírus Bovino), ao local de origem do vírus (e.g. Vírus Ebola, do rio Ébola, no Congo), à doença causada pelo vírus (e.g. Vírus da imunodeficiência humana - HIV).[6]
O Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus (ICTV, do inglês "International Committee on Taxonomy of Virus") estabelece regras de classificação e nomenclatura de vírus. O ICTV é uma entidade composta por grupos especializados de virologistas de todas as partes do mundo.[4]

Esquema da transcrição do genoma viral dos sete grupos segundo a classificação de Baltimore

Classificação de Baltimore

O Sistema de Classificação de Baltimore, criado por David Baltimore, é um modo de classificação que ordena os vírus em sete grupos, com base na característica do genoma viral e na forma como este é transcrito a mRNA. Neste sistema, os vírus são agrupados como apresentado a seguir:[4]
  • Grupo I: Vírus DNA dupla fita (dsDNA)
  • Grupo II: Vírus DNA fita simples (ssDNA)
  • Grupo III: Vírus RNA dupla fita (dsRNA)
  • Grupo IV: Vírus RNA fita simples senso positivo ((+)ssRNA)
  • Grupo V: Vírus RNA fita simples senso negativo ((-)ssRNA)
  • Grupo VI: Vírus RNA com transcrição reversa (ssRNA-RT)
  • Grupo VII: Vírus DNA com transcrição reversa (dsDNA-RT)

Estrutura viral


Esquemas da estrutura de dois vírions:
A. Vírion não envelopado
B. Vírion envelopado
Dentre os vários grupos de vírus existentes, não existe um padrão único de estrutura viral. A estrutura mais simples apresentada por um vírus consiste de uma molécula de ácido nucléico coberta por muitas moléculas de proteínas idênticas. Os vírus mais complexos podem conter várias moléculas de ácido nucléico assim como diversas proteínas associadas, envoltório protéico com formato definido, além de complexo envelope externo com espículas. A maioria dos vírus apresentam conformação helicoidal ou isométrica. Dentre os vírus isométricos, o formato mais comum é o de simetria icosaédrica.[1]

Partícula viral

Os vírus são formados por um agregado de moléculas mantidas unidas por forças secundárias, formando uma estrutura denominada partícula viral.[1] Esta é constituída por diversos componentes estruturais (ver imagem ao lado):
  1. Ácido nucléico: molécula de DNA ou RNA que constitui o genoma viral.
  2. Capsídeo: envoltório protéico que envolve o material genético dos vírus.
  3. Nucleocapsídeo: estrutura formada pelo capsídeo associado ao ácido nucléico que ele engloba.
  4. Capsômeros: subunidades proteícas (monômeros) que agregadas constituem o capsídeo.
  5. Envelope: membrana rica em lipídios que envolve a partícula viral externamente.
  6. Peplômeros (espículas): estruturas proeminentes, geralmente constituídas de glicoproteínas e lipídios, que são encontradas ancoradas ao envelope, expostas na superfície.[1][2]
Uma partícula viral completa é denominada vírion. Os vírions dos diferentes grupos de vírus podem possuir ou não um envelope (derivado da membrana plasmática das células hospedeiras) que envolve a partícula viral externamente.[2]
O envelope protege o genoma viral contido nele e também possibilita ao vírus identificar as células que ele pode parasitar e, em certos vírus, facilita a sua penetração nas próximas células hospedeiras. [carece de fontes]

Genoma viral

Ao contrário das células, que apresentam genoma constituído apenas por DNA, os vírus possuem DNA ou RNA como material genético, e todos os vírus possuem apenas um ou outro no vírion. No entanto, existem vírus que possuem ambos, porém, em estágio diferentes do ciclo reprodutivo.[7] As moléculas de ácido nucléico dos vírus podem ser fita simples ou dupla, linear ou circular, e segmentada ou não. O genoma dos vírus de RNA tem ainda a característica de possuir senso positivo (atua como mRNA funcional no interior das células infectadas) ou senso negativo (serve de molde para uma RNA-polimerase transcrevê-lo dando origem a um mRNA funcional).[2] A quantidade de material genético viral é menor que a da maioria das células.[7] O peso molecular do genoma dos vírus de DNA varia de 1,5 × 106 a 200 × 106 Da. Já o dos de RNA varia de 2 × 106 a 15 × 106 Da. No genoma dos vírus estão contidas todas as informações genéticas necessárias para programar as células hospedeiras, induzindo-as a sintetizar todas as macromoléculas essenciais à replicação do vírus.[2]

Ciclo de replicação viral

Como já mencionado anteriormente, vírus são parasitas intracelulares obrigatórios, pois necessitam do ambiente intracelular de um organismo vivo para se reproduzir. Ao processo de reprodução de um vírus dá-se o nome de replicação viral. O tempo de duração do ciclo de replicação viral varia entre as diversas famílias de vírus, podendo levar poucas horas ou até dias.[8] Esta seção apresentará as etapas envolvidas num ciclo de replicação viral, focado principalmente em vírus que infectam animais. De uma maneira geral, a replicação pode ser dividida em 7 etapas:[3]

Visão geral de um ciclo de replicação viral hipotético: 1. Adsorção; 2. Entrada; 3.
Desnudamento; 4. Transcrição e tradução; 5. Replicação do genoma; 6. Montagem; e 7. Liberação.

Adsorção do vírus à célula

Uma etapa essencial à reprodução viral é a adsorção (ligação) do vírion a uma célula suscetível.[9] A adsorção viral se dá por meio da interação entre proteínas virais, presentes no envelope ou no capsídeo, e receptores celulares que se encontram ancorados a membrana plasmática, expostos ao ambiente extracelular. A ligação entre alguns vírus e células também pode envolver a participação de correceptores (receptores secundários). A especificidade destas interações é alta, como em um modelo chave-fechadura, e determina o tropismo viral para infectar determinadas células e tecidos específicos. Ligações químicas não covalentes, tais como pontes de hidrogênio, atrações iônicas e forças de van der Waals, são responsáveis pela adesão entre as proteínas virais e os receptores celulares.
Nos momentos iniciais da adsorção, a partícula viral interage com um ou poucos receptores, caracterizando uma ligação reversível. Porém, à medida que mais receptores se associam ao vírion, esta ligação passa a ser irreversível, possibilitando a posterior entrada do vírus na célula.[4] Os receptores em geral são proteínas ou carboidratos presentes em glicoproteínas e glicolipídios. Muitas das proteínas receptoras são imunoglobulinas, transportadores transmembrana e canais, ou seja, são estruturas produzidas pelas células para executar funções comuns e essenciais ao bom funcionamento celular. Muitas funcionam como receptores de quimiocinas e fatores de crescimento, ou são responsáveis pelo contato e adesão célula a célula. Os vírus subvertem o papel primordial destas moléculas, utilizando-as como meio para adentrar nas células hospedeiras.[3][4]

Entrada no citosol

Uma vez aderidos à membrana celular, os vírus devem introduzir seu material genético no interior da célula, a fim de que este seja processado (transcrito, traduzido, replicado). Este processo envolve a entrada (penetração) do vírion no citosol e posterior desmontagem do capsídeo para liberação (desnudamento) do genoma viral.[8] Para alcançar o ambiente intracelular, cada vírus utiliza um mecanismo particular. Entre os principais mecanismos (veja imagem abaixo), estão:
  • Endocitose: Após a adsorção, a partícula viral pode penetrar no citoplasma por meio de um processo denominado endocitose mediada por receptores, pela formação de endossomos (vesículas). Quando um vírus entra por endocitose, o seu vírion encontra-se envolto pela membrana vesicular. Vírus envelopados liberam os nucleocapsídeos de dentro dos endossomo promovendo a fusão entre o envelope viral e a membrana da vesícula.[4] Já os vírus não envelopados, por não possuírem envelope, utilizam outras estratégias para sair dos endossomos: alguns, como os adenovírus, provocam a lise do endossomo, enquanto outros, como os poliovírus, geram poros na membrana vesicular e injetam o genoma viral diretamente no citosol.[10]
  • Fusão: Neste mecanismo, executado apenas por vírus envelopados, o nucleocapsídeo é liberado no interior da célula mediante a fusão entre o envelope viral e a membrana celular. A entrada por fusão pode ocorrer de duas formas: (1) direta, pela fusão do envelope viral com a membrana plasmática, a partir do meio extracelular, ou (2) indireta, sofrendo uma endocitose inicial com posterior fusão já no interior da célula, como citado anteriormente.[3]
  • Translocação: por meio da ação de uma proteína receptora, o vírion pode atravessar a membrana por meio de translocação, do ambiente extracelular para o citosol. Este mecanismo é raro e pouco entendido.[3]
Mecanismos de entrada de vírus em células
Endocitose e lise da membrana endossomal
Endocitose e lise da membrana endossomal
Endocitose com injeção do genoma no citosol
Endocitose com injeção do genoma no citosol
Endocitose seguida por fusão de membranas
Endocitose seguida por fusão de membranas
Entrada por fusão de membranas
Entrada por fusão de membranas
Entrada por translocação
Entrada por translocação

Desnudamento do ácido nucléico

Após o processo de penetração, assim que os nucleocapsídeos alcançam o citosol, estes são transportados pelo citoesqueleto (dentro de vesículas ou na forma de nucleocapsídeos livres) em direção ao local específico de processamento do genoma viral, que pode ser no próprio citosol ou no núcleo celular. Para que o genoma possa ser transcrito, traduzido, e replicado, o material genético do vírus deve ser previamente liberado e exposto no ambiente intracelular. A este processo dá-se o nome de desnudamento (ou decapsidação), um procedimento no qual o capsídeo é desmontado completamente ou parcialmente (veja imagem acima). O desnudamento pode ocorrer simultaneamente à entrada do vírus, ou pode acontecer em instantes posteriores. O sítio celular de desnudamento é bastante variável entre as diversas famílias de vírus, podendo ocorrer no citosol (e.g. Togavírus), no interior do endossomo (e.g. Picornavírus), nos poros nucleares (e.g. Adenovírus, Herpesvírus), no interior do núcleo (e.g. Parvovírus, Polyomavírus), ou simplesmente pode não ocorrer (e.g. Reovírus, Poxvírus).[3][6]

Transcrição e tradução da informação genética

Síntese de mRNA

Como mencionado anteriormente, o Sistema de Classificação de Baltimore foi criado com base nos diferentes mecanismos de transcrição que os vírus adotam para sintetizar mRNA a partir dos seus variados tipos de material genético. Os vírus podem ter genoma constituído por dsDNA, ssDNA, dsRNA, ssRNA, além de alguns serem capazes de realizar a transcrição reversa (ssRNA-RT e dsDNA-RT). Outra propriedade notável dos ácidos nucléicos virais é a polaridade (sentido, ou senso) das fitas de DNA e RNA. Fitas senso positivo (+) apresentam seqüência idêntica à do mRNA, enquanto as senso negativo (-) apresentam seqüência nucleotídica complementar. Diante desta complexidade de características, as estratégias de transcrição do genoma viral são tão variadas quanto os mecanismos de entrada, e podem envolver mais de uma etapa, as quais levam à conversão da informação genética viral em mRNA.[4]
  • Grupo I (dsDNA): Vírus de DNA dupla fita apresentam ORFs em ambas as fitas de DNA, as quais servem diretamente como moldes para a síntese de mRNA. Vírus do grupo I que transcrevem o DNA no interior do núcleo utilizam RNA polimerase II celular para a síntese de mRNA, já aqueles que executam este processo no citosol devem possuir sua própria RNA polimerase DNA dependente (RpDd) para produzir os transcritos.[4]
Class I virus (dsDNA) RNA synthesis.svg
  • Grupo II (ssDNA): Vírus de DNA fita simples apresentam fita positiva ou negativa. Para a síntese de mRNA, estes vírus produzem uma respectiva fita complementar ao seu genoma, gerando uma dupla fita que serve como molde para a transcrição. Estes procedimentos ocorrem no núcleo, com o auxílio de enzimas celulares (RpDd e DpDd (DNA polimerase DNA dependente)).[4]
Class II virus (ssDNA) RNA synthesis.svg
  • Grupo III (dsRNA): Vírus de RNA dupla fita apresentam uma fita positiva e outra negativa. A fita negativa é utilizada como molde para a síntese de mRNA, em processo que ocorre no citosol, com auxílio de uma RNA polimerase RNA dependente (RpRd).[4]
Class III virus (dsRNA) RNA synthesis.svg
  • Grupo IV ((+)ssRNA): Vírus de RNA fita simples senso positivo apresentam genoma com seqüência idêntica à do mRNA, e podem ser utilizados prontamente para a síntese de proteínas. No entanto, é usual a síntese de novas cópias positivas do genoma, mediante a ação de uma RpRd, que produz uma fita negativa que serve como molde para a síntese de novas fitas positivas (mRNAs).[4]
Class IV virus (ssRNA +) RNA synthesis.svg
  • Grupo V ((-)ssRNA): Vírus de RNA fita simples senso negativo, por possuírem genoma com seqüência complementar ao mRNA, servem diretamente como molde para a produção de fitas senso positivo. A maioria dos vírus (-)ssRNA (e.g. Rhabdovírus, Filovírus, Bunyavírus, Arenavírus) normalmente procede a transcrição no citosol. Algumas exceções, como os Orthomixovírus, transcrevem seu material genético no núcleo.[11][4]
Class V virus (ssRNA -) RNA synthesis.svg
  • Grupo VI (ssRNA-RT): Vírus de RNA com transcrição reversa (Retrovírus) apresentam genoma de senso positivo. Por meio de uma enzima denominada transcriptase reversa (uma DNA polimerase RNA dependente), os retrovírus produzem uma fita simples de DNA senso negativo que posteriormente serve de molde à síntese de uma fita positiva de DNA. Ao final, este processo gera uma fita dupla de DNA, que poderá ser integrada ao genoma do hospedeiro no núcleo, e utilizada para a síntese de mRNA viral.[11][4]
Class VI virus (ssRNA-RT) RNA synthesis.svg
  • Grupo VII (dsDNA-RT): Vírus de DNA com transcrição reversa (e.g. Hepadnavírus) são vírus dsDNA que promovem a síntese de mRNA no núcleo, sob a ação da RNA polimerase II celular. Neste grupo, a transcrição reversa não ocorre antes síntese de mRNA, como observado nos retrovírus, mas sim posteriormente a replicação do genoma viral.[11][6]
Class VII virus (dsDNA-RT) RNA synthesis.svg

Síntese de proteínas


Eventos finais do ciclo replicativo: 1. Transporte do genoma (DNA ou RNA) para o sítio de processamento (núcleo ou citosol); 2. Transcrição (síntese de mRNA); 3. Síntese de proteínas não estruturais; 4. Replicação do material genético; 5. Síntese de proteínas estruturais; 6. Montagem dos nucleocapsídeos; 7. Vesícula com glicoproteínas direcionadas ao complexo de Golgi; 8. Transporte das proteínas de envelope à membrana celular; 9. Liberação de partículas virais por lise (vírus não envelopados), ou por brotamento (vírus envelopados).
As proteínas virais são sintetizadas pela maquinaria celular (ribossomos, tRNAs). O processo de tradução ocorre no citosol, em ribossomos livres ou associados ao retículo endoplasmático. Algumas das proteínas sintetizadas em ribossomos livres são transportadas para o núcleo. Proteínas produzidas em ribossomos associados ao retículo são transportadas desta organela para o complexo de Golgi, onde podem sofrer modificações pós-traducionais (glicosilação, fosforilação). O destino final de muitas destas proteínas é a membrana celular, onde estas se concentram em regiões específicas. Em estágios finais da infecção, estas farão parte do envelope de partículas virais que sairão por brotamento nessas regiões.[4][6] Dentro do ciclo de replicação, os primeiros produtos gênicos sintetizados são proteínas não-estruturais, como proteínas de ligação ao DNA e enzimas. Entre estas enzimas estão as polimerases e outras moléculas catalíticas, as quais são componentes essenciais à replicação do genoma viral. Já as proteínas estruturais, que formarão as novas partículas virais, normalmente são sintetizadas tardiamente no ciclo de infecção. As novas cópias de material genético sintetizadas são utilizadas para a síntese de mRNAs, os quais codificarão proteínas estruturais que a partir de então serão produzidas em grandes quantidades para compor os vírus em formação. Os diferentes vírus de DNA e RNA possuem mecanismos próprios de regulação da expressão gênica, os quais controlam a produção de proteínas em momentos e quantidades apropriadas às necessidades virais.[11]

Replicação do genoma viral

Na maioria dos casos, o genoma é replicado no mesmo local onde ocorre a transcrição do material genético do vírus, isto é, no citoplasma ou no núcleo.[3] Assim como ocorre na transcrição, o processo de replicação de genomas virais envolve a participação de polimerases. Vírus de fita simples, dos grupos II, IV e V, precisam produzir uma fita complementar ao genoma, que posteriormente servirá de molde para a síntese do material genético. Vírus de fita dupla, dos grupos I e III, utilizam cada uma das duas fitas para gerar suas respectivas cópias complementares. Em geral, moléculas de DNA são sintetizadas a partir de outras moléculas de DNA (DNA → DNA), e o mesmo acontece com moléculas de RNA (RNA → RNA). A exceção a esta regra fica por conta dos vírus que realizam transcrição reversa. Membros do grupo VI (ssRNA-RT) replicam o seu genoma a partir de um intermediário de DNA (RNA → DNA → RNA). Já os membros do grupo VII (dsDNA-RT) replicam o seu genoma a partir de um intermediário de RNA (DNA → RNA → DNA).[4]

Montagem do vírion

A montagem corresponde ao processo de formação das partículas virais infectivas (vírions). Neste estágio do ciclo de infecção, as proteínas estruturais sintetizadas em etapas anteriores se associam para constituir o capsídeo. Capsídeos com formato helicoidal são formados em torno da superfície da molécula de ácido nucléico. Já os capsídeos de simetria icosaédrica são montados previamente e depois preenchidos com o genoma viral, através de um poro na estrutura pré-formada denominada pró-capsídeo. O pró-capsídeo de alguns vírus pode sofrer modificações que levam a formação do capsídeo maduro.[4] O sítio de montagem dos capsídeos depende do local de replicação vrial na célula, e varia entre as diversas famílias de vírus.[3] O procedimento de montagem de vírus não-envelopados se resume a formação dos nucleocapsídeos, enquanto que para vírus envelopados a montagem só se finaliza depois da aquisição do envelope viral. A membrana lipídica do envelope se origina a partir de estruturas celulares, como: membrana plasmática (e.g. Paramyxovírus, Orthomixovírus, Rhabdovírus) e compartimentos membranosos intracelulares (complexo de Golgi, retículo endoplasmático, núcleo).[8] Outro mecanismo de aquisição de envelope é a denominada “síntese de novo” de membranas, no qual o envelope é gradualmente construído em volta do nucleocapsídeo. Este processo pode ocorrer no núcleo (e.g. Baculovírus) ou no citoplasma (e.g. Poxvírus).[4]

Liberação de novas partículas virais

A liberação dos vírions do citosol pode se dar por lise celular ou brotamento. A liberação por lise celular é mais comum aos vírus não-envelopados, e ocorre quando a membrana plasmática da célula infectada se rompe, levando-a morte celular.[3] Porém, nem todo processo de liberação viral causa danos a célula hospedeira. O brotamento é um mecanismo de liberação que pode provocar pouco ou nenhum prejuízo à célula.[6] Vírus que obtém envelope a partir da membrana plasmática saem da célula por meio de brotamento direto do nucleocapsídeo em contato com a face interna da membrana, em regiões específicas, onde se localizam as glicoproteínas virais sintetizadas em momentos prévios da infecção. Vírus com envelope originado de compartimentos intracelulares (organelas) são liberados da célula por meio de vesículas que se fundem com a membrana plasmática. Após a liberação, quando os vírions se encontram no meio extracelular, a maioria deles permanece inerte até que outra célula hospedeira seja infectada, reiniciando o ciclo de replicação viral.[4]

Vírus: seres vivos ou seres não vivos?

A vida, em sua definição biológica, é considerada um complexo e dinâmico estado de interações bioquímicas e biofísicas. Sob esta perspectiva, são citadas duas propriedades básicas de sistemas vivos: (a) são capazes de produzir e utilizar energia química para a síntese de macromoléculas por meio de uma variedade de proteínas, sendo a maior parte delas enzimas, as quais de maneira coordenada atuam nestes processos biossintéticos; (b) possuem ácido nucléico que carrega em sua estrutura os mecanismos essenciais à codificação e decodificação das informações necessárias para a produção das macromoléculas citadas anteriormente.[1]
Há grande debate na comunidade científica sobre se os vírus devem ser considerados seres vivos ou não, e esse debate é primariamente um resultado de diferentes percepções sobre o que vem a ser vida, em outras palavras, a definição de vida. Aqueles que defendem a idéia que os vírus não são vivos argumentam que organismos vivos devem possuir características como a habilidade de importar nutrientes e energia do ambiente, devem ter metabolismo (um conjunto de reações químicas altamente inter-relacionadas através das quais os seres vivos constroem e mantêm seus corpos, crescem e performam inúmeras outras tarefas, como locomoção, reprodução); organismos vivos também fazem parte de uma linhagem contínua, sendo necessariamente originados de seres semelhantes e, através da reprodução, gerar outros seres semelhantes (descendência ou prole), etc. Os vírus preenchem alguns desses critérios: são parte de linhagens contínuas, reproduzem-se e evoluem em resposta ao ambiente, através de variabilidade e seleção, como qualquer ser vivo. [carece de fontes] Vírus não são cultiváveis in vitro, ou seja, não se desenvolvem em meio de cultura contendo os nutrientes fundamentais à vida. Estes se multiplicam somente em tecidos ou células vivas, logo, os vírus não têm qualquer atividade metabólica quando fora da célula hospedeira.[1] Portanto, sem as células nas quais se replicam, os vírus não existiriam.[7] Outro aspecto que distingue vírus e organismos vivos baseia-se no fato dos vírus possuírem consideráveis quantidades de apenas um tipo de ácido nucléico, DNA ou RNA, enquanto todos os organismos vivos necessitam de quantidades substanciais de ambos. Por estes motivos, os vírus são considerados "agentes infecciosos", ao invés de seres vivos propriamente ditos.[1]
Muitos, porém, não concordam com esta perspectiva, e argumentam que uma vez que os vírus são capazes de reproduzir-se, são organismos vivos; eles dependem do maquinário metabólico da célula hospedeira, mas até aí todos os seres vivos dependem de interações com outros seres vivos.[carece de fontes] Assim como plasmídeos e outros elementos genéticos, os vírus se aproveitam da maquinaria celular para se multiplicar. No entanto, diferentemente destes elementos genéticos, os vírus possuem uma forma extracelular por meio da qual o material genético viral é transmitido de um hospedeiro a outro. Em função da existência deste estágio independente das células no ciclo biológico viral, algumas pessoas consideram os vírus como "organismos vivos" ou "formas de vida".[7] Outros ainda levam em consideração a presença massiva de vírus em todos os reinos do mundo natural, sua origem — aparentemente tão antiga como a própria vida —, sua importância na história natural de todos os outros organismos, etc. Conforme já mencionado, diferentes conceitos a respeito do que vem a ser vida formam o cerne dessa discussão. [carece de fontes]
Embora a maioria dos cientistas considerem os vírus como seres vivos, estes não são enquadrados em nenhum dos cinco grandes reinos. [carece de fontes]

A origem dos vírus

A origem dos vírus não é inteiramente clara, e provavelmente, esta seja tão complexa quanto a origem da vida.[1] Porém, foram propostas algumas hipóteses:
  • Evolução química: Os vírus podem representar micróbios extremamente reduzidos, formas primordiais de vida que apareceram separadamente na sopa primordial que deu origem às primeiras células. Com base nisto as diferentes variedades de vírus teriam tido origens diversas e independentes. No entanto, esta hipótese tem pouca aceitação.
  • Evolução retrógrada: Os vírus teríam se originado a partir de microrganismos parasitas intracelulares que ao longo do tempo perderam partes do genoma responsáveis pela codificação de proteínas envolvidas em processos metabólicos essenciais, mantendo-se apenas os genes que garantiriam aos vírus sua identidade e capacidade de replicação.
  • DNA auto-replicante: Os vírus originaram-se a partir de sequências de DNA auto-replicantes (plasmídeos e transposons) que assumiram uma função parasita para sobreviverem na natureza.
  • Origem celular: Os vírus podem ser derivados de componentes de células de seus próprios hospedeiros que se tornaram autônomos, comportando-se como genes que passaram a existir independentemente da célula. Algumas regiões do genoma de certos vírus se assemelham-se a sequências de genes celulares que codificam proteínas funcionais. Esta hipótese é apontada como a mais provável para explicar a origem dos vírus.[1][2]

Doenças humanas virais


Doenças causada através dos vírus.
Como parasitas, os vírus provocam muitas doenças nos seres vivos. Ao invadirem as células de um indivíduo, eles prejudicam o funcionamento normal dessas células e, conseqüentemente, provocam doenças.[carece de fontes]
Principais viroses humanas: gripe, hepatite (A, B e C), caxumba, sarampo, varicela (catapora), SIDA (AIDS), raiva (hidrofobia), dengue, febre amarela, poliomielite (paralisia infantil), rubéola, meningite, encefalite, herpes, febre hemorrágica, pneumonia, HLTV, gripe suína, etc. [carece de fontes] Recentemente foi mostrado que o câncer cervical é causado ao menos em partes pelo papilomavirus (que causa papilomas, ou verrugas), representando a primeira evidência significante em humanos para uma ligação entre câncer e agentes virais. [carece de fontes]

Prevenção e tratamento de doenças virais

Devido ao uso da maquinaria das células do hospedeiro, os vírus tornam-se difíceis de se combater. As mais eficientes soluções médicas para as doenças virais são as vacinas para prevenir as infecções, e drogas que tratam os sintomas das infecções virais. Quando as células são atacadas por vírus, o sistema de defesa do organismo parasitado passa a produzir substâncias especificas que combatem o vírus invasor. Essas substâncias são chamadas anticorpos. Isso ocorre porque os vírus são formados por proteínas diferentes das do organismo parasitado. Essas proteínas não são reconhecidas e o organismo combate-as, passando a produzir anticorpos. Assim, caso o microrganismo parasita invada o nosso corpo novamente, reagimos rapidamente e a doença não se instala.[carece de fontes]
Não existem medicamentos para combater os vírus depois que eles passam a parasitar um organismo. Nesse caso, a pessoa deve se alimentar bem, repousar bastante e esperar que o organismo reaja e produza os anticorpos específicos para destruí-los. É o caso, por exemplo, da gripe. Não existem remédios para essa doença. O que há são medicamentos para aliviar os sintomas desconfortáveis que ela provoca, como dores de cabeça e no corpo., febre, etc. Também não há vacina contra a gripe. O vírus que a causa sofre mutações rapidamente. Há muitos tipos mutantes de vírus da gripe e ainda não se conseguiu produzir uma vacina que possa combater todos esses tipos.[carece de fontes]
As vacinas são produzidas a partir de microrganismos mortos ou atenuados, ou ainda por toxinas inativadas que eles produzem. Uma vez introduzidos num indivíduo, esses agentes não tem condições de provocar a doença, mas são capazes de estimular o organismo a produzir anticorpos. O indivíduo, então, fica imunizado contra a doença. As vacinas, portanto, são usadas para a prevenção de doenças. É importante notar que uma vacina não cura um organismo já parasitado por um vírus ou uma bactéria.[carece de fontes]
A vacina Sabin, por exemplo, usada para prevenir a poliomielite ou paralisia infantil, é feita com vírus causador dessa enfermidade. Só que, ao contrário do vírus normal da doença, o vírus utilizado na vacina é atenuado e não tem condições de atacar o sistema nervoso da pessoa. Porém, como o organismo não diferencia um vírus do outro, ele passa a produzir os anticorpos necessários, imunizando o indivíduo vacinado contra todos os tipos de vírus da poliomielite.[carece de fontes]
Existe também uma nova classe de drogas que serve como tratamento específico contra determinados vírus, os chamados antivirais, dentre os quais pode-se citar: o aciclovir contra o herpesvírus, a ribavirina contra o vírus da hepatite C, o oseltamivir contra o vírus da gripe, o ritonavir, o indinavir e a zidovudina entre outros contra o vírus da AIDS. Os pacientes freqüentemente pedem antibióticos, que são inúteis contra os vírus, e seu abuso contra infecções virais é uma das causas de resistência antibiótica em bactérias.[carece de fontes]

Alguns tipos de vírus perigosos conhecidos

O Ebola é um vírus que, provavelmente, tenha se originado no Zaire e no Sudão em 1976. Mata suas vítimas em poucos dias. Na primeira fase da doença, os sintomas lembram os da malária, mas por volta do quarto dia o quadro já é considerado crítico: febre alta, hemorragia generalizada espontânea, fezes sanguinolentas e vômitos com jatos de sangue. Surgem várias feridas que se espalham pelo corpo rapidamente. A vítima morre por volta do nono dia. No Zaire, o índice de mortalidade chega a 90% das pessoas infectadas.[carece de fontes]
Entre os vírus, cuja existência anterior era desconhecida e aqueles que conhecemos há mais tempo, estão o vírus Sabiá e o vírus da febre amarela.[carece de fontes]
Vírus Sabiá - É um tipo fatal de vírus, que foi isolado no bairro de Sabiá, em Cotia (Grande São Paulo) onde causou uma morte em 1990. Ele causa a febre hemorrágica brasileira. O quadro clínico é semelhante ao da gripe, com náuseas e vômitos, e progride para complicações renais e morte.[carece de fontes]
Foi identificado pelo Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo. Acidentalmente, dois pesquisadores (um em Belém, no Pará e outro nos Estados Unidos) foram infectados, mas conseguiram sobreviver.[carece de fontes]
Vírus da febre amarela - É um vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. A febre amarela ocorre em ciclos naturais na América do Sul, mas foi identificada também na África. Na maioria das vezes, a infecção é subclínica, mas pode se tornar grave e até fatal. A febre amarela clássica caracteriza-se pela ocorrência de febre moderadamente elevada, náuseas, queda no ritmo cardíaco, prostração e vômito com sangue.[carece de fontes]

AIDS: síndrome causada por vírus

A AIDS é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sinais e de sintomas produzidos por mais de uma causa. A Aids é transmitida através de relação sexual e de sangue contaminado.[carece de fontes]
O causador da AIDS é o vírus HIV (sigla em inglês que significa vírus da imunodeficiência humana adquirida). No nosso organismo, esse vírus pode se reproduzir rapidamente e atacar o sistema de defesa do corpo.[carece de fontes]
No nosso corpo existem os linfócitos, um dos tipos de células do sangue, que tem a função de defender o organismo contra invasores (vírus e bactérias), destruindo-os. O vírus da Aids ataca os linfócitos, onde se reproduz. Destruídos os linfócitos em que se originam, os novos vírus são liberados na corrente sangüínea e podem parasitar novos linfócitos. Com isso, o sistema imunológico torna-se deficiente e o portador do vírus fica exposto a doenças infeccionas diversas. Quando não recebe o tratamento adequado, geralmente o doente morre em conseqüência dessas infecções. Hoje em dia existem medicamentos que retardam e controlam o avanço dessa grave doença.[carece de fontes]
Não se pega Aids convivendo socialmente com um soropositivo. Apertar a mão, abraçar ou compartilhar o uso de utensílios domésticos não traz nenhum risco de contágio.[carece de fontes]
Fora do organismo, o HIV pode sobreviver por algumas horas, mas não consegue perfurar a pele de uma pessoa. A transmissão do vírus ocorre geralmente por meio de sangue, esperma e secreções vaginais contaminados. Por isso, alguma medidas de prevenção contra a Aids consistem em:
  • Certificar-se de que o sangue a receber numa transfusão não esteja contaminado (nem com vírus HIV, nem da hepatite, dentre outros);[carece de fontes]
  • Utilizar apenas agulhas e seringas descartáveis, que devem ser usadas uma única vez. Se não for possível utilizar as descartáveis, esterilizar as não descartáveis;[carece de fontes]
As pesquisas sobre Aids costumam receber muitas verbas. Apesar disso, sua cura ainda não foi descoberta, nem foi desenvolvida uma vacina. O que existe atualmente são vários remédios (alguns chamados de coquetéis) que aumentam a sobrevida dos portadores do vírus. Muitas pessoas que não apresentam sintomas podem viver muito tempo sem saber que são portadoras. Outras que manifestam sintomas, quando tratadas adequadamente, podem levar uma vida praticamente normal. Existem pessoas que são portadoras do vírus HIV há mais de dez anos levando uma vida completamente normal.[carece de fontes]

Mutações

Quando os vírus se reproduzem no interior de uma célula viva o material genético viral pode sofrer mutações e gerar grandes variedades a partir de um único tipo desses seres: um exemplo são as dezenas de diferentes tipos de vírus da gripe humana, gerados por mutações. Sendo que essas mutações dificultam as ações dos antivirais, devido esses serem específicos a cada tipo de vírus. [carece de fontes]

Outros agentes infecciosos

Outras partículas infecciosas são tão simples estruturalmente quanto os vírus, estas são os viróides, virusóides, Satellite, Deltavirus (que na verdade são satellites/viróides), e príons. Os príons (ou priões) são agentes ainda mais simples que os vírus. Não possuem ácido nucleico, sendo constituídos por proteínas alteradas que têm a capacidade de converter proteínas semelhantes mas não alteradas à sua configuração insolúvel, precipitando em cristais que causam danos às células. [carece de fontes].
  

Fungos

Fungi

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
(Redirecionado de Fungo)
Como ler uma caixa taxonómicaFungi


Ocorrência: Início do Devónico – Recente (ver texto)
No sentido dos ponteiros do relógio, desde em cima à esquerda: Amanita muscaria, um basidiomicete; Sarcoscypha coccinea, um ascomicete; pão coberto de bolor; um quitrídio; um conidióforo de Penicillium.
No sentido dos ponteiros do relógio, desde em cima à esquerda: Amanita muscaria, um basidiomicete; Sarcoscypha coccinea, um ascomicete; pão coberto de bolor; um quitrídio; um conidióforo de Penicillium.

O reino Fungi é um grande grupo de organismos eucariotas, cujos membros são chamados fungos, que inclui micro-organismos tais como as leveduras e bolores, bem como os mais familiares cogumelos. Os fungos são classificados num reino separado das plantas, animais e bactérias. Uma grande diferença é o facto de as células dos fungos terem paredes celulares que contêm quitina, ao contrário das células vegetais, que contêm celulose. Estas e outras diferenças mostram que os fungos formam um só grupo de organismos relacionados entre si, denominado Eumycota (fungos verdadeiros ou Eumycetes), e que partilham um ancestral comum (um grupo monofilético). Este grupo de fungos é distinto dos estruturalmente similares Myxomycetes (agora classificados em Myxogastria) e Oomycetes. A disciplina da biologia dedicada ao estudo dos fungos é a micologia, muitas vezes vista como um ramo da botânica, mesmo apesar de os estudos genéticos terem mostrado que os fungos estão mais próximos dos animais do que das plantas.
Abundantes em todo mundo, a maioria dos fungos é inconspícua devido ao pequeno tamanho das sua estruturas, e pelos seus modos de vida crípticos no solo, na matéria morta, e como simbiontes de plantas, animais, e outros fungos. Podem tornar-se notados quando frutificam, seja como cogumelos ou como bolores. Os fungos desempenham um papel essencial na decomposição da matéria orgânica e têm papéis fundamentais nas trocas e ciclos de nutrientes. São desde há muito tempo utilizados como uma fonte direta de alimentação, como no caso dos cogumelos e trufas, como agentes levedantes no pão, e na fermentação de vários produtos alimentares, como o vinho, a cerveja, e o molho de soja. Desde a década de 1940, os fungos são usados na produção de antibióticos, e, mais recentemente, várias enzimas produzidas por fungos são usadas industrialmente e em detergentes. São também usados como agentes biológicos no controlo de ervas daninhas e pragas agrícolas. Muitas espécies produzem compostos bioativos chamados micotoxinas, como alcaloides e policetídeos, que são tóxicos para animais e humanos. As estruturas frutíferas de algumas espécies contêm compostos psicotrópicos, que são consumidos recreativamente ou em cerimónias espirituais tradicionais. Os fungos podem decompor materiais artificiais e construções, e tornar-se patogénicos para animais e humanos. As perdas nas colheitas devidas a doenças causadas por fungos ou à deterioração de alimentos pode ter um impacto significativo no fornecimento de alimentos e nas economias locais.
O reino dos fungos abrange uma enorme diversidade de táxons, com ecologias, estratégias de ciclos de vida e morfologias variadas, que vão desde os quitrídios aquáticos unicelulares aos grandes cogumelos. Contudo, pouco se sabe da verdadeira biodiversidade do reino Fungi, que se estima incluir 1,5 milhões de espécies, com apenas cerca de 5% destas formalmente classificadas. Desde os trabalhos taxonómicos pioneiros dos séculos XVII e XVIII efetuados por Lineu, Christiaan Hendrik Persoon, e Elias Magnus Fries, os fungos são classificados segundo a sua morfologia (i.e. caraterísticas como a cor do esporo ou caraterísticas microscópicas) ou segundo a sua fisiologia. Os avanços na genética molecular abriram o caminho à inclusão da análise de ADN na taxonomia, o que desafiou por vezes os antigos agrupamentos baseados na morfologia e outros traços. Estudos filogenéticos publicados no último decénio têm ajudado a modificar a classificação do reino Fungi, o qual está dividido em um sub-reino, sete filos e dez subfilos.

Características

Antes da introdução dos métodos moleculares de análise filogenética, os taxonomistas consideravam que os fungos eram membros do reino Plantae devido a semelhanças nos seus modos de vida: tanto os fungos como as plantas são na sua maioria imóveis, e apresentam semelhanças na morfologia geral e no habitat em que se desenvolvem. Tal como as plantas, muitas vezes os fungos crescem no solo, e no caso dos cogumelos formam corpos frutíferos conspícuos, que por vezes se assemelham a plantas como os musgos. Os fungos são agora considerados um reino separado, distintos das plantas e animais, dos quais parecem ter divergido há cerca de mil milhões de anos.[6][7] Algumas caraterísticas morfológicas, bioquímicas, e genéticas são partilhadas com outros organismos, enquanto outras são exclusivas dos fungos, separando-os claramente dos outros reinos:
Caraterísticas partilhadas:
Caraterísticas únicas:
  • Algumas espécies crescem como leveduras unicelulares que se reproduzem por gemulação ou por fissão binária. Os fungos dimórficos podem alternar entre uma fase de levedura e uma fase com hifas, em função das condições ambientais.[19]
  • A parede celular dos fungos é composta por glicanos e quitina; enquanto os primeiros são também encontrados em plantas e a última no exosqueleto dos artrópodes,[20][21] os fungos são os únicos organismos que combinam estas duas moléculas estruturais na sua parede celular. Ao contrário das plantas e dos Oomycetes, as paredes celulares dos fungos não contêm celulose.[22]
Um cogumelo com forma de funil crescendo na base de uma árvore.
Omphalotus nidiformis, um cogumelo bioluminescente.
A maioria dos fungos carece de um sistema eficiente para o transporte de água e nutrientes a longa distância, como o xilema e o floema de muitas plantas. Para ultrapassar estas limitações, alguns fungos, como os do género Armillaria, formam rizomorfos[23] que são morfológica e funcionalmente semelhantes às raízes das plantas. Outra característica partilhada com as plantas consiste numa via bioquímica para a produção de terpenos que usa ácido mevalónico e pirofosfato como precursores.[24] Porém, as plantas têm uma via bioquímica para a produção de terpenos nos seus cloroplastos, uma estrutura que os fungos não possuem.[25] Os fungos produzem vários metabolitos secundários que são estruturalmente semelhantes ou idênticos aos produzidos pelas plantas.[24] Muitas das enzimas de plantas e fungos que produzem estes compostos diferem entre si na sequência de aminoácidos e outras características, o que indica origens e evolução  separadas destas enzimas nos fungos e plantas.[24][26]

Diversidade

Os fungos têm uma distribuição mundial, e desenvolvem-se numa grande variedade de habitats, incluindo ambientes extremos como desertos ou áreas com elevadas concentrações de sais[27] ou radiações ionizantes,[28] bem como em sedimentos de mar profundo.[29] Alguns podem sobreviver às intensas radiações ultravioleta e cósmica encontradas durante as viagens espaciais.[30]
A maioria desenvolve-se em ambientes terrestres, embora várias espécies vivam parcial ou totalmente em ambientes aquáticos, como o fungo quitrídio Batrachochytrium dendrobatidis, um parasita responsável pelo declínio global das populações de anfíbios. Este organismo passa parte do seu ciclo de vida na forma de um zoósporo móvel, o que lhe permite propulsar-se através da água e entrar no seu hóspede anfíbio.[31] Outros exemplos de fungos aquáticos incluem aqueles que vivem em zonas hidrotermais dos oceanos.[32]
Estão descritas formalmente pelos taxonomistas cerca de 100 000 espécies de fungos,[33] mas a biodiversidade global do reino dos fungos não é totalmente compreendida.[34] Com base em observações do quociente entre o número de espécies de fungos e o número de espécies de plantas em ambientes selecionados, estima-se que o reino dos fungos contenha cerca de 1,5 milhões de espécies.[35] Em termos históricos, em micologia, as espécies têm sido distinguidas por vários métodos e conceitos. A classificação baseada nas caraterísticas morfológicas, como o tamanho e forma dos esporos ou das estruturas frutíferas, tem dominado tradicionalmente a taxonomia dos fungos.[36] As espécies podem também ser distinguidas pelas suas caraterísticas bioquímicas e fisiológicas, tais como a sua capacidade para metabolizar certos compostos bioquímicos, ou a sua reação a testes químicos. O conceito biológico de espécie discrimina as espécies com base na sua capacidade de acasalamento. A aplicação de ferramentas moleculares, como a sequenciação de ADN e a análise filogenética, no estudo da diversidade melhorou significativamente a resolução e aumentou a robustez das estimativas da diversidade genética nos vários grupos taxonómicos.[37]

Morfologia

Estruturas microscópicas


Micrografia de Penicillium spp. (1-hifa, 2-conidióforo, 3-fiálide, 4-conídios, 5-septos)
A maioria dos fungos desenvolve-se como hifas, que são estruturas filamentosas, cilíndricas, com 2 a 10 µm de diâmetro e até vários centímetros de comprimento. As hifas crescem nas suas extremidades (ápices); novas hifas formam-se tipicamente por meio da emergência de novas extremidades ao longo da hifa existente num processo designado “ramificação”, ou ocasionalmente por bifurcação de extremidades de uma hifa em crescimento, dando origem a duas hifas com crescimento paralelo.[38] A combinação do crescimento apical com a ramificação/bifurcação conduz ao desenvolvimento de um micélio, uma rede interconectada de hifas.[19] As hifas podem ser septadas ou cenocíticas: as hifas septadas são divididas em compartimentos separados por paredes transversais (paredes celulares internas, chamadas septos, que se formam perpendicularmente à parede celular, dando à hifa a sua forma), cada compartimento contendo um ou mais núcleos; as hifas cenocíticas não são compartimentadas.[39] Os septos têm poros que permitem a passagem de citoplasma, organelos, e por vezes núcleos; um exemplo é o septo doliporo dos fungos do filo Basidiomycota.[40] As hifas cenocíticas são essencialmente supercélulas multinucleadas.[41]
Muitas espécies desenvolveram estruturas hifais especializadas na absorção de nutrientes dos hospedeiros vivos; dois exemplos são os haustórios nas espécies parasitas de plantas da maioria dos filos de fungos, e os arbúsculos de vários fungos micorrízicos, que penetram nas células do hospedeiro para consumir nutrientes.[42]
Embora os fungos sejam opistocontes – um agrupamento de organismos evolutivamente aparentados, caraterizados em termos gerais por possuírem um único flagelo posterior – todos os filos, exceto o dos quitrídios, perderam os seus flagelos posteriores.[43] Os fungos são incomuns entre os eucariotas por terem uma parede celular que, além dos glicanos (p.e. β-1,3-glicano) e outros componentes típicos, contém também o biopolímero quitina.[44]

Estruturas macroscópicas

Os micélios dos fungos podem tornar-se visíveis a olho nu, por exemplo, em várias superfícies e substratos, tais como paredes húmidas e comida deteriorada, sendo vulgarmente chamados bolores. Os micélios desenvolvidos em meio de ágar sólido em placas de Petri de laboratório são usualmente designados colónias. Estas colónias podem apresentar formas e cores de crescimento (devido aos esporos ou a pigmentação) que podem ser usadas como caraterísticas de diagnóstico na identificação de espécies ou grupos.[45] Algumas colónias individuais de fungos podem atingir dimensões e idades extraordinárias, como é o caso de uma colónia clonal de Armillaria ostoyae, que se estende por mais de 900 ha, com uma idade estimada em cerca de 9 000 anos.[46]
O apotécio – uma estrutura especializada importante na reprodução sexuada de Ascomycetes – é um corpo frutífero em forma de taça que contém o himénio, uma camada de tecido contendo as células portadoras de esporos.[47] Os corpos frutíferos dos basidiomicetes e de alguns ascomicetes podem, por vezes, atingir grandes dimensões, e muitos são bem conhecidos como cogumelos.

Crescimento e fisiologia

O crescimento dos fungos como hifas em substratos sólidos ou como células singulares em ambientes aquáticos, está adaptado para a extração eficiente de nutrientes, pois estas formas de crescimento têm uma razão entre a área superficial e o volume bastante alta.[48] As hifas estão especificamente adaptadas ao crescimento sobre superfícies sólidas e à invasão de substratos e tecidos.[49] Podem exercer grandes forças mecânicas penetrativas; por exemplo, o patógeno vegetal Magnaporthe grisea forma uma estrutura chamada apressório que evoluiu de forma a perfurar tecidos vegetais.[50] A pressão gerada pelo apressório, dirigida contra a epiderme da planta, pode exceder os 8 MPa (80 bar).[50] O fungo filamentoso Paecilomyces lilacinus, usa uma estrutura semelhante para penetrar os ovos de nemátodos.[51]
Time-lapse photography sequence of a peach becoming progressively discolored and disfigured
Bolor cobrindo um pêssego em decomposição. As imagens foram obtidas a intervalos de aproximadamente 12 horas ao longo de seis dias.

A pressão mecânica exercida pelo apressório é gerada a partir de processos fisiológicos que aumentam o turgor intracelular ao produzirem osmólitos como o glicerol.[52] Adaptações morfológicas como estas são complementadas por enzimas hidrolíticas segregadas para o ambiente para a digestão de grandes moléculas orgânicas – como polissacarídeos, proteínas, lípidos, e outros substratos orgânicos – em moléculas menores que podem então ser absorvidas como nutrientes.[53][54][55] A vasta maioria dos fungos filamentosos cresce de um modo polar – i.e., por extensão numa direção – por alongamento no ápice da hifa.[56] Formas alternativas de crescimento dos fungos incluem a extensão intercalar (i.e. por expansão longitudinal de compartimentos hifais que estão abaixo do ápice), como é o caso em alguns fungos endófitos,[57] ou o crescimento por expansão do volume durante o desenvolvimento dos estipes dos cogumelos e doutros grandes órgãos.[58] O crescimento dos fungos como estruturas multicelulares consistindo de células somáticas e reprodutoras – uma característica que evoluiu de modo independente nos animais e plantas[59] - tem várias funções, incluindo o desenvolvimento de corpos frutíferos para a disseminação dos esporos sexuais (ver acima) e de biofilmes para a colonização de substratos e comunicação intercelular.[60]
Tradicionalmente, os fungos são considerados heterotróficos, organismos que dependem exclusivamente do carbono fixado por outros organismos para o seu metabolismo. Os fungos desenvolveram um grau elevado de versatilidade metabólica, o que lhes permite utilizar uma variedade de substratos orgânicos para o seu crescimento, incluindo compostos simples como nitrato, amónia, acetato, ou etanol.[61][62] Demonstrou-se para algumas espécies que o pigmento melanina pode ter um papel na extração de energia da radiação ionizante, como a radiação gama; porém, esta forma de crescimento radiotrófico foi descrita apenas em algumas poucas espécies, os efeitos nas velocidades de crescimento são pequenos, e os processos biofísicos e bioquímicos subjacentes são desconhecidos.[28] Os autores especulam que este processo pode ter semelhança com a fixação do dióxido de carbono via luz visível, mas utilizando radiação ionizante como a fonte de energia.[63]

Reprodução

A reprodução dos fungos é complexa, refletindo as diferenças de modos de vida e da constituição genética existentes neste reino.[64] Estima-se que um terço de todos os fungos pode reproduzir-se usando mais do que um modo de propagação; por exemplo, a reprodução pode ocorrer em dois estágios bem diferenciados no ciclo de vida de uma espécie, o teleomorfo e o anamorfo.[65] As condições ambientais desencadeiam estados de desenvolvimento geneticamente determinados que conduzem à criação de estruturas especializadas para a reprodução sexuada ou assexuada. Estas estruturas auxiliam a reprodução ao dispersarem eficientemente esporos ou propágulos contendo esporos.

Reprodução assexuada

A reprodução assexuada por meio de esporos vegetativos (conídios) ou através da fragmentação do micélio é comum; ela mantém populações clonais adaptadas a um nicho ecológico específico e permite uma dispersão mais rápida do que a reprodução sexuada.[66] Os fungi imperfecti (fungos que não apresentam estágio sexuado) ou Deuteromycota, incluem todas as espécies que não possuem um ciclo sexual observável.[67]

Reprodução sexuada

A reprodução sexuada com meiose existe em todos os filos de fungos, exceto Glomeromycota.[68] Difere em muitos aspetos da reprodução sexuada de animais e plantas. Existem também diferenças entre grupos de fungos, as quais podem ser usadas para discriminar espécies em função de diferenças morfológicas nas estruturas sexuais e das estratégias de reprodução.[69][70] Experiências de acasalamento entre isolados de fungos podem identificar espécies com base no conceito biológico de espécie.[70] Os principais agrupamentos de fungos foram inicialmente delineados com base na morfologia das suas estruturas sexuais e esporos; por exemplo, as estruturas portadoras de esporos, ascos e basídios, podem ser usadas na identificação de ascomicetes e basidiomicetes, respetivamente. Algumas espécies permitem o acasalamento apenas entre indivíduos de tipo reprodutor oposto, enquanto noutras podem acasalar e reproduzir-se sexuadamente com qualquer outro indivíduo ou com eles mesmos. As primeiras dizem-se heterotálicas e as segundas homotálicas.[71]
A maioria dos fungos tem um estágio haploide e um estágio diploide nos seus ciclos de vida. Nos fungos de reprodução sexuada, os indivíduos compatíveis podem combinar-se fundindo as suas hifas numa rede interconetada; este processo, anastomose, é requerido para o início do ciclo sexual. Os ascomicetes e os basidiomicetes passam por um estágio dicariótico, no qual os núcleos herdados dos dois pais não se combinam imediatamente após a fusão celular, antes permanecendo separados nas células hifais (ver heterocariose).[72]

Ascos de Morchella elata com 8 esporos, vistos com microscópio de contraste de fase
Nos ascomicetes, as hifas dicarióticas do himénio (a camada de tecido portador de esporos) formam um gancho caraterístico no septo hifal. Durante a divisão celular, a formação do gancho assegura a correta distribuição dos núcleos recém-divididos nos compartimentos hifais apical e basal. Forma-se então um asco, no qual ocorre cariogamia (fusão dos núcleos). Os ascos estão contidos num ascocarpo, ou corpo frutífero. A cariogamia nos ascos é imediatamente seguida de meiose e pela produção de ascósporos. Após a dispersão, os ascósporos podem germinar e formar um novo micélio haploide.[73]
A reprodução sexuada dos basidiomicetes é semelhante à dos ascomicetes. Hifas haploides compatíveis fundem-se para dar origem a um micélio dicariótico. Porém, a fase dicariótica é mais extensa nos basidiomicetes, estando muitas vezes presente também no micélio em crescimento vegetativo. Uma estrutura anatómica especializada, chamada fíbula, forma-se em cada septo hifal. Tal como com o gancho estruturalmente similar dos ascomicetes, a fíbula dos basidiomicetes é requerida para a transferência controlada de núcleos durante a divisão celular, para manter um estágio dicariótico com dois núcleos geneticamente diferentes em cada compartimento hifal.[74] Forma-se um basidiocarpo, no qual estruturas em forma de bastão chamadas basídios geram basidiósporos haploides após cariogamia e meiose.[75] Os basidiocarpos mais vulgarmente conhecidos são os cogumelos, mas também podem assumir outras formas (ver secção Morfologia).
Nos Glomeromycetes (antes Zygomycetes), as hifas haploides de dois indivíduos fundem-se, formando um gametângio, uma estrutura celular especializada que se torna uma célula produtora de gâmetas férteis. O gametângio evolui para um zigósporo, um esporo com parede espessa formado pela união de gâmetas. Quando o zigósporo germina, sofre meiose, gerando novas hifas haploides, as quais podem então formar esporangiósporos assexuados. Estes esporangiósporos permitem ao fungo dispersar-se rapidamente e germinar como micélios haploides geneticamente idênticos.[76]

Dispersão de esporos


O fungo ninho-de-pássaro Cyathus stercoreus
Tanto os esporos assexuados como os sexuados (esporangiósporos) são frequentemente dispersos por ejeção forçada desde as suas estruturas reprodutoras. Esta ejeção garante a saída dos esporos das estruturas reprodutoras bem como a deslocação através do ar por grandes distâncias.
Mecanismos fisiológicos e mecânicos especializados, bem como as estruturas superficiais dos esporos (como as hidrofobinas), permitem a ejeção eficiente do esporo.[77] Por exemplo, a estrutura das células portadoras de esporos de algumas espécies de ascomicetes é tal, que a acumulação de substâncias que afetam o volume celular e o equilíbrio de fluidos, permite a descarga explosiva dos esporos no ar.[78] A descarga forçada de esporos individuais, designados «balistósporos», envolve a formação de uma pequena gota de água (gota de Buller), que por contacto com o esporo leva à sua libertação com uma aceleração inicial superior a 10 000g;[79] o resultado é o esporo ser ejetado a 0,01 – 0,02 cm, distância suficiente para que caia através das lamelas, ou poros, para o ar abaixo.[80] Outros fungos, como os do género Lycoperdon, dependem de mecanismos alternativos para a libertação dos esporos, como forças mecânicas exteriores. O fungo ninho-de-pássaro usa a força das gotas de água em queda para libertar os esporos dos corpos frutíferos em forma de taça.[81] Outra estratégia é observada em Phallaceae, um grupo de fungos com cores vivas e odor pútrido, que atraem insetos para dispersarem os seus esporos.[82]

Outros processos sexuados

Além da reprodução sexuada normal com meiose, certos fungos, como os dos géneros Penicillium e Aspergillus, podem trocar material genético por processos parassexuais, iniciados pela anastomose entre as hifas e plasmogamia das células dos fungos.[83] A frequência e importância relativa dos eventos parassexuais não são claras, e podem ser menores que as dos outros processos sexuados. Sabe-se que tem um papel na hibridização intra-específica.[84] e é provavelmente requerida para a hibridização entre espécies, a qual foi associada com os principais eventos na evolução dos fungos.[85]

Evolução

Em contraste com os dados conhecidos sobre a história evolutiva das plantas e animais, o registo fóssil antigo dos fungos é muito escasso. Entre os fatores que provavelmente contribuem para a sub-representação das espécies de fungos no registo fóssil incluem-se a natureza dos esporocarpos, que são tecidos moles, carnosos, e facilmente degradáveis, bem como as dimensões microscópicas da maioria das estruturas fúngicas, as quais não são, portanto, muito evidentes. Os fósseis de fungos são difíceis de distinguir daqueles de outros micróbios, e são mais facilmente identificáveis quando se assemelham a fungos atualmente existentes.[86] Muitas vezes recuperadas de um hospedeiro vegetal ou animal permineralizado, estas amostras são tipicamente estudadas usando preparações em lâmina delgada que podem ser examinadas com o microscópio ótico ou por microscópio eletrónico de transmissão.[87] Os fósseis de compressão são estudados por dissolução da matriz circundante com ácido e usando os meios de microscopia já indicados para examinar os detalhes da sua superfície.[88]
Os mais antigos fósseis que apresentam caraterísticas típicas dos fungos datam do éon Proterozoico, há cerca de 1 430 milhões de anos; estes organismos bênticos multicelulares possuíam estruturas filamentosas com septos, e eram capazes de anastomose.[89] Estudos mais recentes (2009), estimam o aparecimento de organismos fúngicos há aproximadamente 760 – 1060 milhões de anos com base em comparações das taxa de evolução em grupos aparentados.[90] Durante grande parte da era paleozoica (há 542 – 251 milhões de anos), os fungos parecem ter sido aquáticos e consistiriam de organismos semelhantes aos atuais quitrídios, com esporos flagelados. [91] A adaptação evolutiva a um modo de vida terrestre necessitou uma diversificação das estratégias ecológicas para a obtenção de nutrientes, incluindo o parasitismo, o saprobismo, e o desenvolvimento de relações mutualistas como as micorrizas e a liquenização.[92] Estudos recentes (2009) sugerem que o estado ecológico ancestral dos Ascomycota era o saprobismo e que eventos independentes de liquenização ocorreram múltiplas vezes.[93]
Os fungos colonizaram a terra provavelmente durante o Câmbrico (há 542 – 488 milhões de anos), muito antes das plantas terrestres.[94] Hifas fossilizadas e esporos recuperados do Ordovícico de Wisconsin (460 milhões de anos) assemelham-se a Glomerales atuais, e existiram numa altura em que a flora terrestre provavelmente consistia apenas de plantas avasculares semelhantes às briófitas.[95] Prototaxites, que era provavelmente um fungo ou um líquen, terá sido o organismo mais alto do final do Silúrico. Os fósseis de fungos apenas se tornam comuns e incontroversos no início do Devónico (há 416 – 359 milhões de anos), sendo abundantes no cherte de Rhynie, sobretudo Zygomycota e Chytridiomycota.[94][96][97] Por esta mesma altura, há cerca de 400 milhões de anos, os Ascomycota e os Basidiomycota divergiram,[98] e todas as classes de fungos modernos estavam presentes no final do Carbónico (Pennsylvaniano, há 318 – 299 milhões de anos).[99]
Fósseis semelhantes a líquenes foram encontrados na formação Doushantuo no sul da China, datados de há 635 a 551 milhões de anos.[100] Os líquenes eram um componente dos primeiros ecossistemas terrestres, e a idade estimada do mais antigo fóssil de líquen terrestre é 400 milhões de anos;[101] esta data corresponde à idade do mais antigo esporocarpo fóssil conhecido, uma espécie de Paleopyrenomycites encontrada no cherte de Rhynie.[102] O mais antigo fóssil com caraterísticas microscópicas semelhantes aos atuais basidiomicetes é Palaeoancistrus, encontrado permineralizado com um feto do Pennsylvaniano.[103] Raros no registo fóssil são os Homobasidiomycetes (um táxon aproximadamente equivalente às espécies produtoras de cogumelos de Agaricomycetes). Dois espécimes preservados em âmbar constituem evidência de que os mais antigos fungos produtores de cogumelos que se conhecem (a espécie extinta Archaeomarasmius legletti) surgiram durante o Cretáceo Médio, há 90 milhões de anos.[104][105]
Algum tempo após a extinção permo-triássica (há 251 milhões de anos), ocorreu um pico de abundância de fungos (originalmente entendido como uma abundância extraordinária de esporos de fungos nos sedimentos), sugerindo que os fungos eram a forma de vida dominante deste período, representando quase 100% do registo fóssil disponível para o mesmo.[106] Contudo, a proporção relativa de esporos fúngicos relativamente aos esporos formados por espécies de algas, é difícil de avaliar,[107] o pico não apareceu em todo o mundo,[108][109] e em muitos locais não diminuiu no limite permo-triássico.[110]

Taxonomia

Embora tradicionalmente incluídos em muitos programas e manuais de botânica, pensa-se agora que os fungos estão mais próximos dos animais do que das plantas e são colocados juntamente com os animais no grupo monofilético dos opistocontes.[111] Análises feitas usando a filogenética molecular suportam a origem monofilética dos fungos.[37] A taxonomia dos fungos encontra-se num estado de fluxo constante, especialmente devido a pesquisas recentes baseadas em comparações de ADN (ácido desoxirribonucleico). Estas análises filogenéticas atuais revogam frequentemente classificações baseadas em métodos mais antigos e menos discriminatórios, baseados em traços morfológicos e conceitos biológicos de espécie, obtidos de acasalamentos experimentais.[112]
Não existe um sistema único de aceitação geral para os níveis taxonómicos mais elevados e ocorrem frequentes mudanças de nomes em todos os patamares acima de espécie. Existem actualmente esforços entre os investigadores para estabelecer e encorajar o uso de uma nomenclatura unificada e mais consistente.[37][113] As espécies de fungos podem também ter múltiplos nomes científicos dependendo do seu ciclo de vida e modo de reprodução (sexuada ou assexuada). Os sítios da internet como Index Fungorum e ITIS listam nomes atuais das espécies de fungos (com referências cruzadas para os sinónimos mais antigos). A classificação do reino Fungi de 2007 é o resultado de um trabalho de investigação colaborativa em grande escala envolvendo dezenas de micologistas e outros cientistas que trabalham sobre a taxonomia dos fungos.[37] Esta classificação reconhece sete filos, dois dos quais - Ascomycota e Basidiomycota – estão contidos num ramo que representa o sub-reino Dikarya. O cladograma à direita representa os principais táxons de fungos e a sua relação com os organismos opistocontes e unicontes. Os comprimentos dos ramos desta árvore não são proporcionais às distâncias evolutivas.

Grupos taxonómicos

Os filos principais (por vezes chamados divisões) dos fungos foram classificados sobretudo com base nas características das suas estruturas reprodutoras. Correntemente, são propostos sete filos: Microsporidia, Chytridiomycota, Blastocladiomycota, Neocallimastigomycota, Glomeromycota, Ascomycota, e Basidiomycota.[37]

Micorriza arbuscular vista ao microscópio. Células corticais da raiz de linho contendo arbúsculos emparelhados.
A análise filogenética demonstrou que os Microsporidia, parasitas unicelulares de animais e protistas, são fungos endobióticos altamente derivados (vivem nos tecidos de outra espécie) e bastante recentes.[91][114] Um estudo de 2006 conclui que os Microsporidia constituem um grupo irmão dos fungos verdadeiros, isto é, cada um deles é o parente evolutivo mais próximo do outro.[115] Hibbett e colegas sugerem que esta análise não colide com a sua classificação de Fungi, e embora Microsporidia tenha sido elevado ao estatuto de filo, reconhece-se que é necessária análise suplementar para clarificar as relações evolutivas no seio deste grupo.[37]
Os Chytridiomycota são vulgarmente conhecidos como quitrídios e têm uma distribuição mundial. Produzem zoósporos capazes de movimento ativo através de fases aquosas, com um único flagelo, o que levou os taxonomistas antigos a classificá-los como protistas. As filogenias moleculares, inferidas de sequências de ARN ribossómico em ribossomas, sugerem que os quitrídios são um grupo basal divergente dos outros filos de fungos, consistindo de quatro clados principais com evidências sugestivas de parafilia ou possivelmente polifilia.[91]
Os Blastocladiomycota eram antes considerados um clado taxonómico dos Chytridiomycota. Contudo, dados moleculares recentes e caraterísticas ultraestruturais, colocam-nos como um clado irmão de Zygomycota, Glomeromycota, e Dikarya (Ascomycota e Basidiomycota). São saprófitas, alimentando-se de matéria orgânica em decomposição, e são parasitas de todos os grupos eucariotas. Ao contrário dos seus parentes mais próximos, os quitrídios, que apresentam sobretudo meiose zigótica, os blastocladiomicetes apresentam meiose espórica.[91]
Os Neocallimastigomycota estavam antes colocados no filo Chytridomycota. Os membros deste pequeno filo são organismos anaeróbicos, vivendo no sistema digestivo de grandes mamíferos herbívoros e possivelmente em outros ambientes terrestres e aquáticos. Não têm mitocôndrias mas contêm hidrogenossomas de origem mitocondrial. Como os quitrídios, os neocallimastigomicetes formam zoósporos que são posteriormente uniflagelados ou poliflagelados.[37]
Os membros de Glomeromycota formam micorrizas arbusculares, uma forma de simbiose na qual hifas fúngicas invadem células das raízes de plantas e ambas as espécies beneficiam do aumento resultante no fornecimento de nutrientes. Todas as espécies conhecidas de Glomeromycota reproduzem-se assexuadamente.[68] A associação simbiótica entre Glomeromycota e as plantas é antiga, existindo provas da sua existência há 400 milhões de anos.[116] Anteriormente parte de Zygomycota, Glomeromycota foi elevado ao estatuto de filo em 2001 e actualmente substitui o filo Zygomycota.[117] Fungos antes classificados em Zygomycota estão agora a ser reclassificados em Glomeromycota, ou nos subfilos incertae sedis Mucoromycotina, Kickxellomycotina, Zoopagomycotina e Entomophthoromycotina.[37] Alguns exemplos bem conhecidos de fungos anteriormente incluídos em Zygomycota incluem o bolor preto do pão (Rhizopus stolonifer), e espécies do género Pilobolus, capazes de ejectar esporos a vários metros de altura através do ar.[118] Entre os géneros medicamente relevantes incluem-se Mucor, Rhizomucor, e Rhizopus.
Cross-section of a cup-shaped structure showing locations of developing meiotic asci (upper edge of cup, left side, arrows pointing to two gray-colored cells containing four and two small circles), sterile hyphae (upper edge of cup, right side, arrows pointing to white-colored cells with a single small circle in them), and mature asci (upper edge of cup, pointing to two gray-colored cells with eight small circles in them)
Diagrama de um apotécio (a estrutura reprodutora em forma de taça típica de Ascomycetes) mostrando tecidos estéreis além de ascos maduros e em desenvolvimento.

Os Ascomycota, vulgarmente conhecidos como fungos de saco ou ascomicetes, constituem o maior grupo taxonómico entre os Eumycota.[36] Estes fungos formam esporos meióticos chamados ascósporos, envolvidos por uma estrutura semelhante a um saco chamada asco. Este filo inclui o género Morchella, alguns cogumelos e trufas, leveduras unicelulares (por exemplo dos géneros Saccharomyces, Kluyveromyces, Pichia, e Candida), e muitos fungos filamentosos que vivem como saprófitas, parasitas, e simbiontes mutualistas. Entre os géneros de ascomicetes mais importantes e relevantes incluem-se Aspergillus, Penicillium, Fusarium, e Claviceps. Em muitas espécies de ascomicetes foi apenas observada reprodução assexuada (ditas espécies anamorfas), mas a análise de dados moleculares tem sido frequentemente capaz de identificar os seus teleomorfos mais próximos entre os Ascomycota.[119] Uma vez que os produtos da meiose são retidos no asco, os ascomicetes têm sido usados para elucidar os princípios da genética e da hereditariedade (por exemplo Neurospora crassa).[120]
Os membros de Basidiomycota, vulgarmente chamados fungos de bastão ou basidiomicetes, produzem meiósporos chamados basidiósporos em estruturas chamadas basídios. A maioria dos comuns cogumelos pertence a este grupo, bem como as ferrugens e os carvões (como o carvão-do-milho, Ustilago maydis),[121] espécies comensais humanas do género Malassezia,[122] e o patógeno oportunista humano, Cryptococcus neoformans.[123]

Organismos semelhantes aos fungos

Por causa das semelhanças morfológicas e de modo de vida, Myxomycetes e Oomycetes eram anteriormente classificados no reino Fungi. Ao contrário do que sucede com os fungos verdadeiros, as paredes celulares destes organismos contêm celulose e não têm quitina. Os Myxomycetes são unicontes como os fungos, mas são agrupados em Amoebozoa. Os Oomycetes são bicontes, agrupados no reino Chromalveolata. Nenhum destes dois grupos é aparentado com os fungos verdadeiros, e, portanto, os taxonomistas já não os incluem no reino Fungi. Apesar disso, estudos sobre Oomycetes e Myxomycetes são ainda frequentemente incluídos em manuais de micologia e em literatura de pesquisa primária.[124]
Os Nucleariida, actualmente agrupados em Choanozoa, poderão ser um grupo irmão do clado Eumycetes, e como tal poderiam ser incluídos num reino Fungi aumentado.[125]

Ecologia

Embora frequentemente inconspícuos, os fungos ocorrem em todos os ambientes da Terra e desempenham papéis muito importantes na maioria dos ecossistemas. Ao lado das bactérias, os fungos são os principais decompositores na maioria dos ecossistemas terrestres (e em alguns aquáticos), tendo, portanto, um papel crítico nos ciclos biogeoquímicos,[126] e em muitas cadeias tróficas. Como decompositores, têm um papel essencial nos ciclos de nutrientes, especialmente como saprófitas e simbiontes, ao degradarem a matéria orgânica em moléculas inorgânicas, que podem então reentrar nas vias metabólicas anabólicas das plantas ou outros organismos.[127][128]

Simbiose

Muitos fungos têm importantes relações simbióticas com organismos da maioria dos reinos (ou mesmo de todos).[129][130][131] Estas interacções podem ser de natureza mutualista ou antagonística; no caso dos fungos comensais parecem não trazer prejuízo nem benefício ao hospedeiro.[132][133][134]

Com as plantas

A simbiose micorrízica entre plantas e fungos é uma das mais bem conhecidas associações entre plantas e fungos e tem uma importância significativa para o crescimento e persistência das plantas em muitos ecossistemas; mais de 90% das plantas estabelecem relações micorrízicas com fungos e dependem desta relação para sobreviverem.[135]
A microscopic view of blue-stained cells, some with dark wavy lines in them
Os filamentos escuros são hifas do fungo endofítico Neotyphodium coenophialum nos espaços intercelulares do tecido da bainha da folha de Festuca arundinacea

A simbiose micorrízica é antiga, datando de há pelo menos 400 milhões de anos.[116] Frequentemente, esta relação aumenta a absorção de compostos inorgânicos pela planta, tais como nitrato e fosfato, de solos com baixas concentrações destes nutrientes imprescindíveis para as plantas.[127][136] Os parceiros fúngicos podem também mediar a transferência de carboidratos e outros nutrientes entre plantas. Tais comunidades micorrízicas são chamadas «redes micorrízicas comuns».[137] Um caso especial de micorriza é a mico-heterotrofia, em que uma planta parasita o fungo, obtendo todos os seus nutrientes do seu fungo simbionte.[138] Algumas espécies de fungos vivem nos tecidos no interior das raízes, caules e folhas, sendo então designados endófitos.[139] Tal como nas micorrizas, a colonização endofítica por fungos pode beneficiar os dois simbiontes; por exemplo, os endófitos de ervas fornecem ao seu hospedeiro resistência aumentada aos herbívoros e a outras pressões ambientais, recebendo em troca alimento e abrigo.[140]

Com algas e cianobactérias

A green, leaf-like structure attached to a tree, with a pattern of ridges and depression on the bottom surface
O líquen Lobaria pulmonaria, uma simbiose de espécies de fungos, algas e cianobactérias.
Os líquenes são formados por uma relação simbiótica entre algas ou cianobactérias (designados na terminologia dos líquenes como "fotobiontes") e fungos (sobretudo várias espécies de ascomicetes e alguns basidiomicetes), na qual células fotobiontes individuais encontram-se disseminadas num tecido formado pelo fungo.[141] Os líquenes ocorrem em todos os ecossistemas e em todos os continentes, e desempenham um papel-chave na formação do solo e na iniciação da sucessão biológica,[142] sendo as formas de vida dominantes em ambientes extremos, incluindo as regiões desérticas polares, alpinas e semiáridas.[143] São capazes de crescer em superfícies inóspitas, incluindo solos e rochas nus, cascas de árvores, madeira, conchas, cracas e folhas.[144] Como no caso das micorrizas, o fotobionte fornece açúcares e outros carboidratos através da fotossíntese, enquanto o fungo fornece minerais e água. As funções de ambos os organismos simbióticos estão tão intimamente relacionadas que eles funcionam quase como um só organismo; na maioria dos casos o organismo resultante difere muito dos componentes individuais. A linquenização é um modo comum de nutrição; cerca de 20% dos fungos – entre 17 500 e 20 000 espécies – são liquenizados.[145] Entre as caraterísticas comuns à maioria dos líquenes incluem-se a obtenção de carbono orgânico por fotossíntese, crescimento lento, tamanho reduzido, vida longa, estruturas reprodutoras vegetativas de longa duração (sazonais), nutrição mineral obtida sobretudo de fontes aéreas, e maior tolerância à dessecação que a da maioria dos organismo fotossintéticos no mesmo habitat.[146]

Com os insetos

Muitos insetos têm relações mutualistas com fungos. Vários grupos de formigas cultivam fungos da ordem Agaricales como fonte de alimento primária, enquanto algumas espécies de carunchos cultivam várias espécies de fungos nas cascas das árvores que infestam.[147] De igual modo, as fêmeas de várias espécies de vespas-da-madeira (género Sirex) injetam os seus ovos juntamente com os esporos de um fungo decompositor de madeira (Amylostereum areolatum) no alburno de pinheiros; o crescimento do fungo fornece as condições nutricionais ideais para o desenvolvimento das larvas da vespa.[148] Sabe-se que também as térmitas da savana africana cultivam fungos,[149] e leveduras dos géneros Candida e Lachancea habitam no trato gastrointestinal de uma grande variedade de insetos, incluindo Neuroptera, escaravelhos, e baratas; não se sabe se estes fungos obtêm algum benefício dos seus hospedeiros.[150]

Como patógenos e parasitas

A thin brown stick positioned horizontally with roughly two dozen clustered orange-red leaves originating from a single point in the middle of the stick. These orange leaves are three to four times larger than the few other green leaves growing out of the stick, and are covered on the lower leaf surface with hundreds of tiny bumps. The background shows the green leaves and branches of neighboring shrubs.
O patógeno vegetal Aecidium magellanicum causa uma ferrugem, vista aqui num arbusto de Berberis no Chile.
Muitos fungos são parasitas de plantas, animais (incluindo humanos), e doutros fungos. Entre os patógenos importantes de muitas plantas cultivadas que causam danos e prejuízos à agricultura e silvicultura incluem-se o fungo da brusone do arroz, Magnaporthe oryzae,[151] patógenos de árvores que causam a grafiose do ulmeiro, tais como Ophiostoma ulmi e Ophiostoma novo-ulmi,[152] e Cryphonectria parasitica responsável pelo cancro do castanheiro,[153] e patógenos vegetais dos géneros Fusarium, Ustilago, Alternaria, e Cochliobolus.[133] Alguns fungos carnívoros, como Paecilomyces lilacinus, são predadores de nemátodos, que capturam usando um conjunto de estruturas especializadas como anéis constritores ou malhas adesivas.[154]
Alguns fungos podem causar doenças graves em humanos, várias delas fatais se não tratadas. Entre estas incluem-se aspergiloses, candidíases, coccidioidomicose, criptococose, histoplasmose, micetomas, e paracoccidioidomicose. Também as pessoas com imunodeficiências são particularmente suscetíveis a doenças causadas por géneros como Aspergillus, Candida, Cryptococcus,[134][155][156] Histoplasma,[157] e Pneumocystis.[158] Outros fungos podem atacar os olhos, unhas, cabelo, e especialmente a pele, os chamados fungos dermatófitos e queratinófitos, causando infecções locais como dermatofitose e pé-de-atleta.[159] Os esporos dos fungos são também uma causa de alergias, e fungos de diferentes grupos taxonómicos podem provocar reações alérgicas.[160]

Uso humano

Microscopic view of five spherical structures; one of the spheres is considerably smaller than the rest and attached to one of the larger spheres
Células de Saccharomyces cerevisiae vistas com microscopia de contraste de interferência diferencial.
O uso humano dos fungos na preparação e conservação de alimentos e com outros fins, é extenso e tem uma longa história. A apanha e o cultivo de cogumelos são grandes indústrias em muitos países. O estudo dos usos históricos e impacto sociológico dos fungos é conhecido como etnomicologia. Por causa da capacidade deste grupo para produzir uma enorme variedade de produtos naturais com atividades antimicrobianas ou outras, muitas espécies são há muito usadas, ou estão em estudo, para a produção de antibióticos, vitaminas, e drogas anticancerígenas e redutoras do colesterol. Mais recentemente, foram desenvolvidos métodos de engenharia genética para fungos,[161] permitindo a engenharia metabólica de espécies de fungos. Por exemplo, modificações genéticas de espécies de leveduras[162]— que são fáceis de cultivar com taxas de crescimento elevadas em grandes vasos de fermentação—abriu novos caminhos à produção farmacêutica e são potencialmente mais eficientes do que a produção pelos organismos-fonte originais.[163]

Antibióticos

Muitas espécies produzem metabolitos que são fontes importantes de drogas farmacologicamente activas. Particularmente importantes são os antibióticos, incluindo as penicilinas, um grupo estruturalmente relacionado de antibióticos betalactâmicos sintetizados a partir de pequenos péptidos. Apesar de as penicilinas de ocorrência natural como a penicilina G (produzida por Penicillium chrysogenum) terem um espectro de atividade biológica relativamente estreito, uma grande variedade de outras penicilinas podem ser produzidas por modificação química das penicilinas naturais. As penicilinas modernas são compostos semissintéticos, obtidos inicialmente de culturas de fermentação, mas em seguida estruturalmente alterados para obtenção de propriedades desejáveis específicas.[164] Entre outros antibióticos produzidos por fungos incluem-se: griseofulvina de Penicillium griseofulvin usada no tratamento de infecções da pele, cabelo e unhas, causadas por dermatófitos;[165] ciclosporina, usada como imunossupressor em cirurgia de transplantação; e o ácido fusídico, usado para ajudar no controlo de infecção pela bactéria Staphylococcus aureus resistente à meticilina.[166] O uso em larga escala destes antibióticos no tratamento de doenças bacterianas, como a tuberculose, sífilis, lepra, e muitas outras, começou no início do século XX e continua a desempenhar um papel principal na quimioterapia antibacteriana. Na natureza, os antibióticos de origem fúngica ou bacteriana, parecem desempenhar um duplo papel: em concentrações elevadas agem como defesa química contra a competição de outros micro-organismos em ambientes ricos em espécies, como a rizosfera, e em baixas concentrações funcionam como moléculas de deteção de quórum para sinalização intra ou interespecífica.[167]

Usos alimentares

A levedura de padeiro ou Saccharomyces cerevisiae, um fungo unicelular, é usado para fazer pão e outros produtos à base de trigo.[168] Espécies de leveduras do género Saccharomyces são também usadas na produção de bebidas alcoólicas por fermentação.[169] O bolor shoyu koji (Aspergillus oryzae) é um ingrediente essencial na preparação de shoyu (molho de soja), saqué, e miso,[170] enquanto espécies de Rhizopus são usadas para fazer tempeh.[171] Vários destes fungos são espécies domesticadas que foram selecionadas segundo a sua capacidade de fermentar alimentos sem produzirem micotoxinas (ver abaixo) prejudiciais, as quais são produzidas pelos muito aparentados Aspergillus.[172] Quorn, um substituto de carne, é feito a partir de Fusarium venenatum.[173]

Uso medicinal


Certos cogumelos são utilizados com fins terapêuticos em medicinas tradicionais, como acontece na medicina tradicional chinesa. Entre os cogumelos medicinais notáveis, e com uma história de uso bem documentada, incluem-se Agaricus blazei,[174][175] Ganoderma lucidum,[176] e Cordyceps sinensis.[177] As pesquisas identificaram compostos produzidos por estes e outros fungos, os quais têm efeitos biológicos inibidores contra vírus[178][179] e células cancerosas.[174][180] Metabolitos específicos, como polissacarídeo-K, ergotamina e antibióticos betalactâmicos, são usados de modo rotineiro em medicina clínica. O cogumelo shiitake é uma fonte de lentinano, uma droga clínica aprovada para utilização em vários países, incluindo o Japão, em tratamentos oncológicos.[181][182] Na Europa e no Japão, o polissacarídeo-K, um químico obtido de Trametes versicolor, é um adjuvante aprovado em terapia oncológica.[183]

Espécies comestíveis e venenosas

Two light yellow-green mushrooms with stems and caps, one smaller and still in the ground, the larger one pulled out and laid beside the other to show its bulbous stem with a ring
Amanita phalloides é responsável pela maioria das mortes por envenenamentos por cogumelos que ocorrem em todo o mundo.
Os cogumelos comestíveis são exemplos bem conhecidos de fungos. Muitos são cultivados comercialmente, mas outros têm de ser colhidos no estado selvagem. Agaricus bisporus, vendidos como champignon enquanto pequenos e como cogumelos Portobello quando maiores, é uma espécie bastante consumida, usada em saladas, sopas e outros pratos. Muitos fungos asiáticos são cultivados comercialmente e são cada vez mais populares no Ocidente. Estão frequentemente disponíveis frescos em mercearias e mercados, incluindo o cogumelo-de-palha (Volvariella volvacea), cogumelo-ostra (Pleurotus ostreatus), shiitake (Lentinula edodes), e enokitake (Flammulina spp.).[184]
Há muitas outras espécies de cogumelos que são colhidas no estado silvestre, quer para consumo pessoal quer para venda comercial. Exemplos: sancha, Morchella, cantarelos, trufas, trombetas-negras, e cepe-de-bordéus (também conhecido como cogumelo porcini, boleto ou tortulho) têm um preço elevado no mercado. São muitas vezes usados em pratos gourmet.[185]
Certos tipos de queijos requerem a inoculação dos coalhos do leite com espécies de fungos que fornecem um sabor e textura únicos ao queijo. Entre eles contam-se os queijos azuis como o Roquefort ou o Stilton, inoculados com Penicillium roqueforti.[186] Os bolores usados na produção de queijo não são tóxicos e portanto são seguros para consumo humano; contudo, pode ocorrer acumulação de micotoxinas (aflatoxinas, roquefortina C, patulina, ou outras) devido ao crescimento de outros fungos durante o processo de maturação e armazenamento do queijo.[187]
Muitas espécies de cogumelos são venenosas para os humanos, com toxicidades que podem ir desde problemas digestivos ligeiros ou reações alérgicas, e alucinações até a falha de órgãos e morte. Entre os géneros com cogumelos tóxicos incluem-se Conocybe, Galerina, Lepiota, e o mais infame, Amanita.[188] Este último género, inclui o anjo-destruidor (Amanita virosa) e o chapéu-da-morte (A. phalloides), a causa mais comum de envenenamento mortal por cogumelos.[189] Gyromitra esculenta é ocasionalmente considerado uma especialidade culinária quando cozinhado, porém, pode ser muito tóxico quando consumido cru.[190] O míscaro-amarelo (Tricholoma equestre) era considerado comestível até ter sido implicado em envenamentos sérios causadores de rabdomiólise.[191] O mata-moscas (Amanita muscaria) pode também causar envenenamentos ocasionais não fatais, sobretudo como resultado da sua ingestão como droga recreativa, devido às suas propriedades alucinogénicas. Historicamente, este cogumelo foi usado por diferentes povos europeus e asiáticos e o seu uso presente com propósitos religiosos ou xamanísticos é relatado em alguns grupos étnicos como os coriacos do nordeste da Sibéria.[192]
Uma vez que é difícil identificar com exatidão um cogumelo seguro sem treino e conhecimento apropriados, é frequentemente indicado que se deve assumir que um cogumelo selvagem é venenoso e não consumi-lo.[193][194]

Controlo de pragas

Two dead grasshoppers with a whitish fuzz growing on them
Gafanhotos mortos por Beauveria bassiana
Em agricultura, os fungos podem ser úteis se competirem ativamente com micro-organismos patogénicos como bactérias e outros fungos, pelos nutrientes e espaço, segundo o princípio da exclusão competitiva,[195] ou se forem parasitas desses patógenos. Por exemplo, certas espécies podem ser usadas para eliminar ou suprimir o crescimento de patógenos vegetais, como insetos, pulgões, ervas daninhas, nemátodos, e outros fungos causadores de doenças em colheitas importantes.[196] Isto gerou um forte interesse nas aplicações práticas que utilizam fungos como controlo biológico destas pragas agrícolas. Fungos entomopatogénicos podem ser usados como biopesticidas, pois matam ativamente os insetos.[197] Exemplos de fungos usados como inseticidas biológicos são Beauveria bassiana, Metarhizium anisopliae, Hirsutella spp, Paecilomyces spp, e Verticillium lecanii.[198][199] Os fungos endofíticos de ervas do género Neotyphodium, como N. coenophialum, produzem alcalóides que são tóxicos para vários herbívoros invertebrados e vertebrados. Estes alcaloides protegem as ervas da herbivoria, mas vários alcaloides endofíticos podem envenenar animais de pasto, como gado bovino e ovelhas.[200] A infecção de cultivares de ervas de pastagem e forragens com endófitos de Neotyphodium é uma abordagem em uso em programas de criação de ervas; as estirpes fúngicas são selecionadas por produzirem apenas alcaloides que aumentam a resistência a herbívoros como os insetos, mas que não são tóxicos para o gado.[201]

Biorremediação

Alguns fungos, em particular a podridão-branca, podem degradar inseticidas, herbicidas, pentaclorofenol, creosoto, alcatrão de hulha, e combustíveis pesados, transformando-os em dióxido de carbono, água, e elementos básicos.[202] Demonstrou-se que há fungos capazes de biomineralizar óxidos de urânio, sugerindo que podem ter aplicação na biorremediação de sítios poluídos radioactivamente.[203][204][205]

Organismos modelo

Algumas descobertas fulcrais da biologia foram feitas por investigadores que usavam fungos como organismos modelo, isto é, fungos que crescem e reproduzem-se sexuadamente de forma rápida em laboratório. Por exemplo, a hipótese um gene-uma enzima foi formulada por cientistas que usaram o bolor do pão Neurospora crassa para testar as suas teorias bioquímicas.[206] Outros fungos modelo importantes, Aspergillus nidulans e as leveduras, Saccaromyces cerevisiae e Schizosaccharomyces pombe, têm cada um uma longa história de uso na investigação de questões da genética e biologia celular dos eucariotas, como a regulação do ciclo celular, estrutura da cromatina, e regulação dos genes. Outros modelos fúngicos surgiram mais recentemente, direccionados para questões biológicas específicas relevantes para a medicina, fitopatologia e usos industriais; entre os exemplos incluem-se Candida albicans, um fungo dimórfico, e patógeno humano oportunista,[207] Magnaporthe grisea, um patógeno vegetal,[208] e Pichia pastoris, uma levedura amplamente usada na expressão de proteínas eucariotas.[209]

Outros

Os fungos são muito utilizados na produção industrial de produtos químicos como os ácidos cítrico, glucónico, láctico e málico,[210] antibióticos, e até de gangas deslavadas.[211] Os fungos são também fontes de enzimas industriais, como as lipases usadas em detergentes biológicos,[212] amilases,[213] celulases,[214] invertases, proteases e xilanases.[215] Algumas espécies, mais particularmente cogumelos do género Psilocybe (coloquialmente chamados cogumelos mágicos), são ingeridos pelas suas propriedades psicadélicas, tanto recreativamente como religiosamente.

Micotoxinas

(6aR,9R)-N-((2R,5S,10aS,10bS)-5-benzyl-10b-hydroxy-2-methyl-3,6-dioxooctahydro-2H-oxazolo[3,2-a] pyrrolo[2,1-c]pyrazin-2-yl)-7-methyl-4,6,6a,7,8,9-hexahydroindolo[4,3-fg] quinoline-9-carboxamide
Ergotamina, uma das principais micotoxinas, produzida por espécies de Claviceps, que ingerida, pode causar gangrena, convulsões, e alucinações
Muitos fungos produzem compostos biologicamente ativos, vários dos quais são tóxicos para animais ou plantas, os quais são designados micotoxinas. Particularmente relevantes para os humanos são as micotoxinas produzidas pelos bolores que causam a deterioração de alimentos, e os cogumelos venenosos (ver acima). Particularmente dignas de nota são as amatoxinas de alguns cogumelos Amanita, e ergotaminas, as quais têm uma longa história de causarem sérias epidemias de ergotismo em pessoas que consomem centeio e cereais relacionados contaminados com esclerócios de Claviceps purpurea.[216] Outras micotoxinas notáveis são as aflatoxinas, as quais são toxinas hepáticas insidiosas e metabolitos altamente carcinogénicos produzidos por certas espécies de Aspergillus, que muitas vezes se desenvolvem em cereais ou em nozes consumidas por humanos, ocratoxinas, patulina, e tricotecenos (por exemplo, micotoxina T-2) e fumonisinas, as quais têm um impacto significativo sobre as reservas alimentares e no gado.[217]
As micotoxinas são metabolitos secundários, e as pesquisas demonstraram a existência nos fungos de vias bioquímicas com o único propósito de produzir micotoxinas e outros produtos naturais.[218] As micotoxinas podem fornecer benefícios de aptidão em termos de adaptação fisiológica, competição com outros micróbios e fungos, e protecção contra o consumo (fungivoria).[219][220]

Micologia

A micologia é um ramo da biologia que se ocupa do estudo sistemático dos fungos, incluindo as suas propriedades genéticas e bioquímicas, a sua taxonomia, e a sua utilidade para os humanos como fontes de medicamentos, alimento, substâncias psicotrópicas consumidas com propósitos religiosos, bem como os seus perigos, como o envenenamento e infecção. O campo da fitopatologia, o estudo das doenças das plantas, está estreitamente relacionado com a micologia, pois muitos dos patógenos vegetais são fungos.[221]
O uso dos fungos pelos humanos data da pré-história. Ötzi, o Homem do Gelo, uma múmia de um homem do Neolítico com 5 300 anos de idade encontrada nos Alpes austríacos, transportava consigo duas espécies de cogumelos poliporos que podem ter sido usados como mecha (Fomes fomentarius), ou para fins medicinais (Piptoporus betulinus).[222] Os povos antigos usaram os fungos como fontes de alimento – frequentemente sem o saberem – durante milénios, na preparação de pão levedado e sumos fermentados. Alguns dos mais antigos registos escritos contêm referências a destruições de colheitas provavelmente causadas por fungos patogénicos.[223]

História

A micologia é uma ciência relativamente recente que se tornou sistemática após o desenvolvimento do microscópio no século XVI. Embora os esporos de fungos tenham sido observados pela primeira vez por Giambattista della Porta em 1588, o trabalho seminal no desenvolvimento da micologia terá sido a publicação em 1729 da obra Nova plantarum genera de Pier Antonio Micheli.[224] Micheli não só observou esporos, como mostrou que sob as condições apropriadas, eles poderiam ser induzidos a desenvolverem-se na mesma espécie de fungo da qual haviam sido originados.[225] Estendendo o uso do sistema binomial de Carl Linnaeus no seu Species plantarum (1753), o neerlandês Christiaan Hendrik Persoon (1761–1836) estabeleceu a primeira classificação de cogumelos com tal perícia, que é considerado um dos fundadores da micologia moderna. Mais tarde, Elias Magnus Fries (1794–1878) melhorou a classificação dos fungos, usando a cor dos esporos e várias características microscópicas, métodos ainda hoje usados pelos taxonomistas. Entre outros contribuidores notáveis no desenvolvimento da micologia nos séculos XVII-XIX e início do século XX incluem-se Miles Joseph Berkeley, August Carl Joseph Corda, Anton de Bary, os irmãos Louis René e Charles Tulasne, Arthur H. R. Buller, Curtis G. Lloyd, e Pier Andrea Saccardo. O século XX assistiu à modernização da micologia, devido aos avanços na bioquímica, genética, biologia molecular e biotecnologia. O uso das tecnologias de sequenciação de ADN e da análise filogenética, forneceu novas pistas sobre as relações dos fungos e a biodiversidade, e desafiou as classificações tradicionais da taxonomia dos fungos baseadas na morfologia.[226]